24.01.2013 - 14:56
O povo da Catalunha, ao longo da sua história, tem vindo a expressar democraticamente a vontade de se autogovernar, com o objectivo de melhorar o progresso, o bem-estar e a igualdade de oportunidades de toda a cidadania, e para reforçar a cultura própria e a sua identidade colectiva.
O autogoverno da Catalunha fundamenta-se também nos direitos históricos do povo catalão, nas suas instituições seculares e na tradição jurídica catalã. O parlamentarismo catalão tem as suas origens na Idade Média, com as assembleias da Paz e Tréguas de Deus e da Cúria Condal.
No século XIV, foi criada a Diputació del General ou Generalitat, cuja autonomia foi gradualmente crescendo até chegar a funcionar, durante os séculos XVI e XVII, como o governo do Principado da Catalunha. A queda de Barcelona em 1714, na sequência da Guerra da Sucessão espanhola, teve como resultado que Filipe V abolisse, através do Decreto da Nova Planta, o direito público catalão e as suas instituições de autogoverno.
Este itinerário histórico foi partilhado com outros territórios, o que configurou um espaço comum linguístico, cultural, social e económico, com vocação de reforço e de promoção através do reconhecimento mútuo.
Durante todo o século XX, a aspiração de autogoverno dos catalães e das catalãs foi sempre uma constante. A criação em 1914 da Mancomunitat de Catalunya, abolida depois pela ditadura de Primo de Rivera, seria supostamente o primeiro passo para a recuperação desse autogoverno. Com a proclamação da Segunda República espanhola, foi constituído em 1931 um governo catalão sob o nome de Generalitat da Catalunha e obteve-se um Estatuto de Autonomia.
A Generalitat foi de novo abolida em 1939 pelo general Franco, que instaurou um regime ditatorial que durou até 1975. A ditadura contou com uma resistência activa do povo e do governo da Catalunha. Um dos pontos marcantes da luta pela liberdade foi a criação da Assembleia da Catalunha em 1971, ainda antes da provisória reinstalação da Generalitat, com o regresso do seu presidente do exílio em 1977. Na transição democrática e no contexto do novo sistema autonómico definido pela Constituição espanhola de 1978, o povo da Catalunha aprovou em 1979 através de um referendo o Estatuto de Autonomia da Catalunha e realizou em 1980 as primeiras eleições para o Parlamento da Catalunha.
Nos últimos anos, na via do aprofundamento democrático, a maioria das forças políticas e sociais catalãs têm impulsionado medidas de transformação do quadro político e jurídico. A mais recente foi concretizada no processo de reforma do Estatuto de Autonomia da Catalunha, iniciado pelo Parlamento no ano de 2005. As dificuldades e rejeições por parte das instituições do estado espanhol, entre as quais importa destacar a sentença 31/2010 do Tribunal Constitucional, espelham uma oposição radical à evolução democrática das aspirações colectivas do povo catalão no seio do estado espanhol, criando as bases para uma regressão no sistema de autogoverno, que actualmente se revela com toda a clareza nos domínios político, das competências, financeiro, social, cultural e linguístico.
Por diversas formas, o povo da Catalunha tem vindo a expressar o desejo de superar a actual situação de bloqueio, no marco do estado espanhol. As gigantescas manifestações do 10 de Julho de 2010, sob o lema ‘Somos uma nação, nós decidimos’, e do 11 de Setembro de 2012, sob o lema ‘Catalunha, novo estado da Europa’, demonstraram o repúdio da cidadania pela falta de respeito para com as decisões do povo da Catalunha.
Com data de 27 de Setembro de 2012, através da resolução de 742/IX, o Parlamento da Catalunha constatou a necessidade do povo da Catalunha poder determinar livre e democraticamente o seu futuro colectivo, através de uma consulta. As recentes eleições ao Parlamento da Catalunha, a 25 de Novembro de 2012, expressaram e confirmaram esta vontade, de maneira clara e inequívoca.
Para levar a cabo este processo, o Parlamento da Catalunha, reunido na primeira sessão da X Legislatura, e em representação da vontade dos cidadãos da Catalunha democraticamente expressa nas últimas eleições, formula a seguinte Declaração de Soberania e do Direito a Decidir do Povo da Catalunha:
Declaração de Soberania e do Direito a Decidir do Povo da Catalunha
De acordo com a vontade maioritária, democraticamente expressa pelo povo da Catalunha, o Parlamento da Catalunha decide iniciar o processo para tornar efectivo o direito a decidir, a fim de que os cidadãos e as cidadãs da Catalunha possam decidir o seu futuro político colectivo, de acordo com os seguintes princípios:
-Soberania. O povo da Catalunha tem, por razões de legitimidade democrática, carácter de sujeito político e jurídico soberano.
-Legitimidade democrática. O processo do exercício do direito a decidir será escrupulosamente democrático, garantindo especialmente a pluralidade de opções e o respeito por todas elas, através do debate e do diálogo no seio da sociedade catalã, a fim de que o pronunciamento resultante seja a expressão maioritária da vontade popular, garantia fundamental do direito a decidir.
-Transparência. Serão fornecidos todos os meios necessários para que o conjunto da população e a sociedade civil catalã tenham todas as informações e conhecimentos requeridos para o exercício do direito a decidir e se promova a sua participação no processo.
-Diálogo. Dialogar-se-á e negociar-se-á com o estado espanhol, as instituições europeias e o conjunto da comunidade internacional.
-Coesão social. Garantir-se-á a coesão social e territorial do país e a vontade expressa em muitas ocasiões pela sociedade catalã de manter a Catalunha como um único povo.
-Europeísmo. Serão defendidos e promovidos os princípios fundadores da União Europeia, especialmente os direitos fundamentais dos cidadãos, a democracia, o compromisso com o estado de bem-estar, a solidariedade entre os povos da Europa e a aposta no progresso económico, social e cultural.
-Legalidade. Serão usados todos os marcos legais existentes para tornar efectivos o fortalecimento da democracia e o exercício do direito a decidir.
-Protagonismo do Parlamento. O Parlamento, como instituição que representa o povo da Catalunha, tem um papel principal neste processo e, portanto, deverão ser acordados e concretizados os mecanismos e as dinâmicas de trabalho que garantam este princípio.
-Participação. O Parlamento da Catalunha e o Governo da Generalitat deverão tornar participantes activos neste processo o poder local e o máximo número de forças políticas, agentes económicos e sociais e entidades culturais e cívicas do nosso país, e especificar os mecanismos que garantam este princípio.
O Parlamento da Catalunha incentiva todos os cidadãos e cidadãs a serem activos e protagonistas neste processo democrático do exercício do direito a decidir do povo da Catalunha.
Palácio do Parlamento, 22 de Janeiro de 2013